Voltei para casa dirigindo perigosamente rápido. Danem-se os outros carros, os outros motoristas. Nenhum deles está sendo estrangulado por dentro pelas próprias vísceras. Ora, a maior parte do trânsito é composta de homens, eles não tem nem ideia do tipo de dor que me acomete. Casa! Casa! Casa!
Empurro um comprimido de ácido mefenâmico para dentro e tento respirar, enquanto ligo o computador, atrás de algo que me distraia e me faça esquecer do órgão se retorcendo debaixo da almofada quente, que deveria aliviar a situação, mas só me deixa mais tensa.
O passarinho preto e amarelo salta aos meus olhos com a fatídica pergunta: O que você está fazendo? Maldita hora que instalei esse programinha. "Morrendo de dor, seu idiota!", tenho vontade de gritar de volta para ele - para o mundo - no auge do meu desequilíbrio mental, antes de tacar o computador no chão.
Ele é autista e incansável. Não se importa com quem responde, apenas pergunta indiscriminadamente e de diversas formas sobre a vida alheia. Talvez quem esteja do outro lado se importe, mas nada garante que leia ou que possa fazer algo a respeito. Continuo dialogando com meu recém-elegido algoz, que quer saber em que estou pensando.
Estou pensando em porque eu passo por isso todo mês e outras pessoas não. Porque tem mulher que nem sabe o que é TPM. Porque tem mulher que sobrevive de hamburguer e batata frita e é magra, tem a pele perfeita e eu não vejo se retorcendo pelos cantos a procura da droga perfeita para aliviá-la. E em porque não existe a droga perfeita. Estou pensando porque o espelho aponta para mim e ri da minha cara como se eu tivesse engordado uns 20 Kg.
Estou pensando que alguém me disse uma vez que eu não podia deixar meus estresses profissonais/acadêmicos interferirem nos meus relacionamentos pessoais e vice-versa. Imagino, então, que meus estresses físicos e psicológicos, meus momentos de esquizofrenia sem cabimento, também não devam interferir. E por que me disseram isso, se ninguém é assim? Se ninguém consegue? Por que eu tenho que ser contida, controlada, sã, se os outros podem se estressar e me estressar junto, se sobrecarregar e ter mal-humor e eu tenho que segurar as pontas? Por que eu passo a semana achando que sobrou tudo pra mim? Será o tal momento esquizofrênico e depois passa? Será que se eu gritar alguém escuta?
Antes que eu possa concatenar as ideias, o pássaro já se inquietou e me perguntou o que estou lendo. Estou lendo a porra da bula do remédio, me preparando para os efeitos colaterais que terei que relevar. Estou lendo o cursor piscando na tela branca. Estou lendo as 13 páginas que podem definir os próximos anos da minha vida. Não, não estou lendo nada, porque eu vejo as letras formando palavras e as palavras formando frases e nenhuma delas faz sentido.
O gorgeio já mudou e eu nem vi. A pergunta, na verdade, é sobre o que eu quero da vida. O que vou fazer hoje?
Hoje? Hoje eu vou morrer e vou nascer homem. Hoje eu vou matar um homem. Talvez dois. E meio. Vou matar uma mulher também. Não, eu vou matar a fome. Às vezes a barriga dói, a cólica aumenta, e é só fome. Mas pode ser sede também. Ou vontade de fazer xixi. Talvez seja o calor que me irrita, ou o frio que me incomoda. Tudo dói do mesmo jeito, como vou saber?!
A cabeça também dói. O pássaro pia, pia, faz barulho, balança-se todo. Eu não piei nada. Não me expus. Não gritei. Não disse que estava com dor, que estava triste, que estava louca ou que não queria nada com a vida. Outros piam de volta para o pássaro e eu leio o que dizem, mas não compreendo bem.
Na verdade, no momento, não compreendo nada muito bem... Tá tudo meio lento. A bula dizia que podia causar sonolência e que não podia operar máquinas pesadas. Acho que também não posso dirigir, mas já não lembro.
Me deito, fecho os olhos e deixo a luz se distanciar, o barulho se afastar, a loucura se dissolver. Antes de adormecer, tenho um lampejo de lucidez. Vai passar. A insegurança, a insanidade, a tortura auto-imposta vão se diluir e, assim como as dores, vão passar.
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Tá, eu não gostei do final, mas dá um desconto. Não estou tão mal assim, as cólicas já deixaram de ser excruciantes, estão só beirando o insuportável e eu não desejei matar ninguém. Neste mês (hehehe!). Mas estou de TPM (PMS, em inglês - explicando o título e as fotos) e com o raciocínio ligeiramente prejudicado.
Em breve
Agora eu vou dormir, que o remédio que tomei realmente dá sono e eu fico meio lesa e sem noção de espaço, então dirigir está fora de cogitação. Se o mundo não for capaz de esperar, azar o dele, que eu é que não arriscarei o meu lindo
2 comentários:
Coitado de Guga...
Pra sorte dele, isto é um conto. Este mês ele mal teve trabalho comigo. Mas sim, eu tenho pena dele por causa dos meses anteriores que eu fiquei muito chata/chorona/estressada... heheh!
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